“Li no muro a frase do poeta: “Entre a raiz e a flor há o tempo.”
por Luisa Simão, aquarelista
Os olhos marejaram sem que eu pudesse entender o motivo. Sentei na prancheta horas depois, ainda tomada pela emoção não compreendida. Papéis, tintas, pincéis, gesto. Vi-me imersa no presente. Cada pincelada revelava a efemeridade do instante, a transitoriedade capaz de tornar cada obra única, cada cena irrepetível.
A tinta sobre a água me obrigava a esperar. Ela seguia seu curso, independente de mim. Minha intervenção naquele momento, extrairia toda a naturalidade da mancha que, no seu tempo, ocuparia seu lugar de destino. Me dou conta da minha insignificância e, ao mesmo tempo, da grandeza daquele momento. Respiro fundo e espero. Observo. Lido com a minha ansiedade. Reconheço a inevitabilidade da mudança, enquanto observo o pigmento ser absorvido pelo algodão do papel. Não controlo tudo. Na verdade: não controlo nada.
A noção da impermanência que permeia todas as coisas, me toma por completo, me mostrando que a arte e o tempo dançam em um eterno jogo de luz e sombra.
Abraço, então, o tempo como meu aliado, meu parceiro de criação. Em cada pincelada, em cada gota de tinta, vejo não apenas o presente, mas também a promessa de um amanhã repleto de novas possibilidades. Um testemunho do meu tempo. Uma herança que deixo, sem perceber.
Me lembro da frase de Drummond. Vejo a raiz, vejo a flor. Vejo o espaço entre elas. Espaço esse, essencial para o florescer.
Espaço tempo.