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Música

por Nath Rodrigues

O tempo, este enigma cravado nos dias e no movimento de todas as coisas, já foi descrito de muitas maneiras e perspectivas através da música, filosofia, psicanálise, física, matemática e tantas quais forem as formas de reconhecer o mundo como essa bússola movida a este combustível sem fim, que invariavelmente se coloca diante de nós como um enigma, como uma dádiva ou como um problema.

Em meio a curiosidades, excitações e angústias, falar do tempo é algo inerente à nossa era, talvez como nunca em relação a outros momentos da história. O tempo, este ponteiro que em muitas culturas também foi ou é lido como uma divindade, se converteu na moeda do século.

Rememorando uma história recente, passando pelo período colonial, atravessando a revolução industrial e chegando ao topo da cadeia alimentar da vida tecnológica que rege e pauta nosso modo de estar no mundo, principalmente nas cidades, nossa relação com o tempo tem cada vez mais se tornado a cifra pela qual o capitalismo contemporâneo se debruça e estipula suas novas regras.

Com a “uberização” da vida, essa característica trazida junto da revolução tecnológica, que nos coloca como chefes e subordinadas de nós mesmas, com o íntimo da vida cotidiana aberto ao público, com o trabalho atravessando as dimensões físicas e costumeiras das relações, a digitalização do dinheiro, a automação das profissões, a presença cada vez mais naturalizada e presente da inteligência artificial, a forma como consumimos música, comida, literatura e outras tantas artes e expressões contemplativas se converteu em quanto tempo cada pessoa tem disponível para determinada experiência, função e ação e como isso pode ser sintetizado em produtividade. A dimensão do tempo, que parecia ter uma escala de hierarquia sobre nós (e que paradoxalmente segue tendo), tem sido compulsivamente comprimida e monetizada.

O tempo virou artigo de luxo.

Pensando no meu lugar de fala mais íntimo, o tempo é o permanente regente desta ferramenta preciosa que é a música, e, quando digo música, não falo necessariamente ou somente de um modelo estético específico, de um gênero musical dominante, ou de sons organizados como conhecemos, mas digo de sua forma mais elementar, como o som presente nas coisas, proveniente da existência, habitante da fala, das interjeições e, principalmente, auto regulador do nosso próprio corpo.

Convertido em ritmo, o tempo dita nossos ciclos internos, a relação entre nossa circulação sanguínea, nosso conjunto de movimentos involuntários como batimentos cardíacos, respiração, peristaltismo, o ritmo de vida, morte e funcionamento das nossas células, o desenvolvimento interno do nosso corpo como um poderoso universo auto gestionado que tem a capacidade incrível de seguir existindo em troca constante com o também imenso universo que se encontra fora de nosso íntimo.

Posto tudo isso, qual a dimensão do tempo (de sua ausência, principalmente) no funcionamento deste enorme e complexo organismo vivo que é você?

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